quarta-feira, 29 de julho de 2009


O Eterno Retorno


Ano passado perdi o emprego, estava sem mulher e tudo o que eu tinha na vida era um Fiat Pálio 2002. Ao me ver reduzido a esta situação desesperadora, fui obrigado a recorrer ao bom senso: vendi o carro e comprei uma passagem pra Paris.


Como diz meu amigo Joãozinho: o que é um peido pra quem está todo cagado?


Tinha por lá hospedagem garantida. Já sabia que o vinho era barato (de dois a três euros um bom tinto “nacional”). Nada me prendia aqui. Passei vinte e três dias perambulando por lugares míticos como o Quartier Latin, Montparnasse, Montmartre e - principalmente - pela discreta Babél da putaria que são as ruas perpendiculares à Praça Clichy.


De uma coisa tenho certeza: ninguém chegou a ir tão longe de Pálio.


O quadro acima se chama “Le Origine du Monde” e foi pintado por Gustave Coubert, sob encomenda de um sultão colecionador de arte erótica, em 1866. Nem preciso falar sobre o escândalo que causou. O que me surpreende é a comoção que ele insiste em causar ainda hoje. De Paris, criei uma página no Orkut, pra ir mandando fotos da viagem pra jaguarada. Várias foram de obras dos museus que visitei – mas nenhuma ganhou tantos comentários quanto esta.


O xibiu está exposto no museu d´Orsay, no fundo de uma sala, de modo que, ao passar pela porta, o sujeito dá de cara com ele. Depois de percorrer as outras exposições, voltei lá, e fiquei me divertindo com a reação das pessoas.


Sorrisos nervosos, caras de nojo, crianças puxadas pela mão. Um troço impressionante. Em certa altura, a sala vazia, entrou um japonês com sua câmera.


Do meu canto, fingia olhar outras pinturas. Então estampei no rosto um sorriso de fauno e fiquei encarando japa, sem que ele visse.


O flash espocou umas duas vezes. Até que, pelo canto dos olhos, ele percebeu minha presença. O japinha estremeceu dentro das calças. Ato contínuo, vermelho como o sol nascente, fez uma reverência - e azulou da sala num passinho miúdo, vergado pelo peso da câmera.


Certa vez, numa conversa pós-coito, uma namorada reclamou da falta de um nome bonito “pra ela”. Tive que concordar. Xavasca, buceta, vagina e xibiu, por exemplo, não são, realmente, as palavras mais bonitas do nosso léxico. Já caralho, pau e cacete estão em todas as bocas, fazem parte do vocabulário cotidiano, evocando ou não o dito cujo.


Monoel de Barros apela pra ironia e pro latim quando a denomina, num poema, de “urna consolata”. Onetti, referindo-se, imagino, à região do púbis, fala em certa altura da “consoladora almofadinha”. Um mistério, um consolo, uma ofensa: três expressões deste poder inominável que a mulherada abriga no estojo acirrado das coxas.


Pra mim, acompanhada do seu tímido vizinho, ela sugere um ponto de exclamação. As vezes até invertido, ao modo castelhano (depende da posição a partir da qual a admiramos).


Surpresa, espanto, arrebatamento, entusiasmo, cólera, dor.


A Wickpedia ainda informa que na sinalética de trânsito, quando abrigado por um triângulo vermelho, o ponto de exclamação significa perigo.





9 comentários:

Sérgio disse...

Oi Nilo,
Parabéns pelo blog. Ótimos textos. Peguei a dica lá no Atire no Dramaturgo. Vou virar frequentador e linkar no meu bloguinho.
Grande abraço e sucesso.
Sérgio

Nilo Oliveira disse...

Valeu, Sérgio. Qual o link do teu blog? Tenho que tirar um tempo pra linkar uns amigos por aqui também. Abraço.

Anônimo disse...

O blog tá do caralho, Nilo. É nóis. Grande abraço, Jarbas Capusso Filho

Nilo Oliveira disse...

Grande Jarbas... Eu também estou gostando. Pelo menos está muito bem frequentado. Grande abraço.

Anônimo disse...

Pois é. Tá na hora de vender o meu Gol Bola, largar o meu modesto - porém indigno -emprego de vendedor de consórcios e correr atrás. Uma bucetinha dessas já vale as quatro rodas do carro.

Abração,

André Rodrigues.

Nilo Oliveira disse...

Mas tem o outro lado da moeda: esta é a única que cheguei a ver por lá. Abraço.

ZECA LEMBAUM disse...

Cara, eu não vendi carro algum (é que eu não tenho), mas também fui a Paris em junho de 2008 - e também fiquei de botuca, vendo as reações do povo diante da Origem do Mundo, lá D'orsay. Acredite: teve gente que chamou o hugo, deixando todo o almoço no piso do museu - mó inhaca.

Nilo Oliveira disse...

É. Há mais mistérios entre uma coxa e outra do que sonha nossa vã filosofia.

Alice V S disse...

Ta deitando e rolando com o briquedinho novo, né negão? Que maravilha. Vc se diverte e de quebra, diverte os amigos. Ueba! E aquele que tava assando ontem, só sai na fornada de amanhã? : (