sexta-feira, 11 de maio de 2012


Rubem Braga


"Da minha janela percebo um movimento em um ponto do mar; é um homem nadando. Nada a uma certa distância da praia, em braçadas pausadas e fortes. Acompanho seu esforço solitário, como se ele estivesse cumprindo uma bela missão.


Já nadou em minha presença uns trezentos metros; antes, não sei. Duas vezes o perdi de vista, quando ele passou atrás das árvores, mas esperei com toda confiança que reaparecesse sua cabeça e o movimento alternado de seus braços. 


Mais uns cinquenta metros o perderei de vista, pois um telhado o esconderá. 


Que ele nade bem essa distância: é preciso que conserve bem a mesma batida de sua braçada e que eu o veja desaparecer assim como vi aparecer, no mesmo rumo, forte, lento, sereno. E então poderei sair da varanda tranquilo: 'Vi um homem sozinho, nadando no mar; quando o vi ele já estava nadando; acompanhei-o com atenção durante todo o tempo, e testemunho que ele nadou sempre com firmeza e exatidão; esperei que ele atingisse um telhado vermelho, e ele o atingiu'.


Não desço para ir esperá-lo na praia e lhe apertar a mão; mas dou meu silencioso apoio, minha atenção e minha estima a esse desconhecido, a esse nobre animal, a esse homem, a esse correto irmão."


(Trecho da crônica "Homem no Mar", publicada originalmente no livro "Ai de ti, Copacabana" e apresentada aqui conforme Millôr Fernandes a resumiu - segundo ele, "sem alteração de palavra" - para abrir sua peça "O Homem do Princípio ao Fim".)

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