Há duas postagens, afirmei que encontrar um autor segue as mesmas razões misteriosas e aleatórias que desencadeiam qualquer encontro. E, quando a coisa chega a acontecer, se parece mesmo com um encontro amoroso, ou entre amigos que já se sabem eternos nas primeiras conversas (mais ou menos como disse o Vinícius de Moraes, um cara que entendia do assunto: "A gente não faz amigos, reconhece-os").
Pois bem.
Faltou acrescentar que, exatamente por este motivo, tenho várias restrições quanto ao ensino da literatura seguir pedagogia idêntica a que se utiliza pra ensinar matemática, química, geografia etc.. Isto pra mim é a mesma coisa que impor a gurizada uma amizade ou um casamento: não existe caminho mais seguro pra rejeição e pro ódio.
Sou uma das provas vivas do que esta violência pode causar. Até hoje não consigo ler Machado de Assis, por exemplo (pelo menos do jeito que ele merece), por causa da forma que seus livros me foram apresentados e cobrados na escola.
Como entrar no clima do Dom Casmurro se pra mim a Capitu - numa alucinação certamente motivada pelo terror mental - ganhou a cara definitiva da D. Socorro, minha professora de literatura do segundo ano científico? Não tem "olhos de cigana oblíqua e dissimulada" que consigam substituir, no meu porongo educado aos esculaxos, a cara de buldogue e a voz de cacatua daquela véia.
Seguindo essa lógica - e já que todas as campanhas de incentivo parecem não dar resultado - cheguei a conclusão que o melhor a fazer não é apenas abolir as aulas de literatura em escolas e universidades, mas também PROIBIR a leitura de contos, romances e poesias pra menores de 21 anos.
Aproveitando então o ensejo, divulgo aqui um Projeto de Lei, cujas bases foram delineadas há dois anos, num dos primeiros textos deste blogue:
Projeto de Lei para
Prevenção e Combate a Leitura
1) Todos os pais que incentivarem seus filhos menores a ler deverão ser tratados como infratores, e imediatamente denunciados ao Conselho Tutelar.
2) Para o melhor interesse da criança e do adolescente, será da obrigação dos pais:
2.1) Tirar os menores da sala quando for pronunciada a palavra "livro";
2.2) E, com igual objetivo, ameaçar com pimenta na boca se algum filho menor pronunciar tal palavra;
2.3) Bater na mãozinha do filho cada vez que ele tente tocar um dos referidos objetos;
2.4) Dizer que livro vicia, deixa a pessoa abobada e faz crescer cabelo na mão;
2.5) Advertir que meninos que lêem criam peitinhos, e que as meninas, nunca arranjarão namorado;
2.6) Conservar em casa um armário trancado, do qual só os adultos tenham a chave, sendo permitido castigar fisicamente qualquer fedelho que dali se aproxime;
2.7) Na falta de um lugar específico e devidamente trancafiado, os livros deverão ficar escondidos na prateleira mais alta do guarda roupa, debaixo do colchão ou fechados numa caixa, junto com os acessórios lúbricos da mãe, bem no fundo da gaveta de lingeries.
3) Com o mesmo intuito, caberá as autoridades competentes:
3.1) Colocar uma tarja preta na capa de cada livro, alertando para possíveis efeitos alucinatórios, além de seqüelas físicas e mentais;
3.2) E, na contracapa, uma foto do Fabrício Carpinejar, como exemplo do mal que a leitura pode causar se consumida em excesso;
3.3) Botar o Ziraldo no pau-de-arara e expô-lo à execração pública, junto a uma fogueira com todas as suas obras;
3.4) Permitir programas sobre literatura apenas depois da meia-noite;
3.5) Criar grupos de estudo compostos por psiquiatras e psicólogos, com bolsa-auxílio do CNPq, para dar respaldo científico aos danos causados pelo vício solitário da leitura;
3.5) Criar uma polícia especial para fiscalizar e combater o consumo de livros por menores de 21 anos.
Convoco a todos - pais, autoridades, educadores e profissionais da saúde - a erguerem comigo esta bandeira.
Ameacem. Mistifiquem. E, sobretudo - proibam.
Porque as coisas não podem continuar do jeito que estão.
2 comentários:
Escrevi uma crônica sobre isso: "Bukowski contra o crime".Apoiado!
Vou linkar lá no facebook. Abraço,MM
Falou, Mirisola. Já vi lá. Valeu e um grande abraço.
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